domingo, 11 de outubro de 2015

"Sentes que por dentro algo está prestes a se acabar em um terremoto? O verdadeiro amanhecer é noturno pra quem vive a recolher destroços de pedaços de pessoas acabadas. Os bolsos cheios de fissuras para acompanhar o resto das mãos. As mãos cheias de anéis para desafiar os dedos. Os dedos cheios de pedras do terço para esquecer o nada das mãos. Por que você sonha em fugir, baby? Chora! Mostre que por dentro ainda tem vida. Viva! Mostre pro choro o que está dentro do que está fora do que está dentro. Se ajoelhe sobre teus restos, se é que ainda restaste alguma coisa ímpar, e ore para as paredes te ouvirem, porque nenhuma voz trêmula é capaz de ressuscitar santos inóspitos pelos ouvidos. Nenhum sopro teu é capaz de apagar uma vela que já nem acende. Derretida. Fossilizada. Cáustica. No permear lacerante do aqui e agora, enquanto queima mais um dos teus cigarros - nesse cinzeiro sujo e fedido que é isso que você chama de vida… Tentando catastroficamente esquecer destes teus vícios em criar desumanidades, em pisar sobre miragens e extraviar vendavais solenes de fraqueza ao desalento, por ser celeste demais pra se apegar ao que é mundano e só saber amar o que é assumidamente feito de pó."
— Michael Letto